São Paulo é cheia de detalhes incríveis que as vezes passam despercebidos no meio tudo que acontece nessa cidade. Se você olhar pra cima, provavelmente vai ver uma infinidade de prédios – e se você subir em um lugar bem alto e olhar em volta, provavelmente vai ver a mesma coisa. Para alguns, pode parecer a mesmice de uma grande selva de pedra. Mas existe muita beleza nisso tudo, sabia?

É engraçado notar como a verticalização mudou ao longo dos anos. O que antes era singular e novidade e agora chama pouca atenção, com raras ressalvas de grupos que investem em construções mais criativas. A cada esquina surge um novo empreendimento, com grandes chances de tornar o cenário ainda mais tedioso a quem já se acostumou com os muros altos, câmeras, andares de garagem espalhados por aí ou  caixotes de concreto sem nenhum carisma – um mal gosto que insistem em chamar de estilo “neoclássico”. Pouco convidativo, inclusive para os olhos.

Na década de 1920, as elites de São Paulo perceberam que o Brasil estava atrasado em relação as artes no velho continente, e, nesse momento, começou um enorme esforço para trazer algumas das ideias que circulavam pela Europa para o Brasil. Nesse contexto, a verticalização da cidade começou. E trouxe edifícios munidos de uma grande quantidade de apartamentos bem amplos, com janelas do chão ao teto, colunas, pastilhas, painéis artísticos, grades de ferro fundido, materiais nobres e jardins tanto no chão quanto nas alturas. A arquitetura foi integrada com o paisagismo e as artes plásticas, fazendo com que algumas das construções fossem verdadeiras obras de arte – provando que as paisagens urbanas realmente merecem um olhar mais atento.

Nós separamos alguns dos nossos prédios favoritos dessa cidade, usando os seguintes critérios: uso residencial, bom gosto e arquitetura sofisticada – de preferência, que não seja cafona.

1. Edifício Anchieta

Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Anchieta


Ninguém se lembra de que ali ainda é Avenida Paulista, mas é. Entre a Rua da Consolação e a Rua Minas Gerais, a dois quarteirões derradeiros da avenida mais querida da cidade. Aquele pedaço abriga um dos principais ícones modernistas paulistanos, o Edifício Anchieta. Inaugurado em 1941, possuía alguns dos principais traços modernistas como pilotis (aqueles pilares no térreo que sustentam a construção, grande novidade na época), apartamentos duplex e painéis de pastilhas coloridas.

O projeto é o escritório carioca M Roberto, que além de ser uma lenda modernista, é uma das mais longevas empresas de arquitetura do país, em atividade desde 1930, quando foi fundada por Marcelo Roberto. O prédio é lembrado pelos paulistanos por um motivo muito mais etílico do que arquitetônico: no térreo, funcionou por muitos anos o Bar Riviera – ponto de referência na cultura boêmia de São Paulo. O Riviera fechou as portas em 2006, após 56 anos de funcionamento e um atoleiro de dívidas que terminou em despejo.


Infelizmente, o Edifício Anchieta já viu dias melhores. O jardim transformou-se em terra seca, da fachada vê-se vidros quebrados, pichações e infiltrações nas paredes. Nem de longe lembra o edifício cheio de vida de décadas atrás. E se a coisa anda feia mesmo ele estando em plena Paulista, imagina como não estarão outros de vias menos frequentadas da cidade. Mas ainda assim, naquela quadra esquecida da Avenida Paulista, o Anchieta é uma memória da São Paulo modernista – e bon-vivant – de décadas atrás.

2. Edifício Parque das Hortênsias

entrada do edifício Parque das Hortências


João Artacho Jurado é, sem dúvidas, um dos nomes mais polêmicos entre os famosos da arquitetura do século XX. Talvez porque ele foi autodidata em construção, sem nunca ter diploma tradicional na área, ou talvez pelos seus projetos ousados em ao que estava sendo feito na época, ou talvez pelo enorme sucesso que fez como empreiteiro - amado por uns, odiado por muitos outros, mas sem dúvidas uma figura importante na história da cidade.


Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Parque das Hortências


Assim que se entra no Parque das Hortênsias, se percebe que esse não é só mais uma construção genérica da cidade. Suas fachadas são coloridas e cercadas por jardins – inclusive nas janelas! Os corredores verdes são difíceis de se encontrar nas construções de hoje mas fazem toda a diferença na vida de quem gosta de plantinhas. Além de abundância de área verde, o lote em que ele foi construído é generoso e permite a liberdade das formas criadas pelo arquiteto. O tamanho das áreas comuns projetadas por ele (em 1957!) causam inveja na maioria dos projetos atuais que valorizam a ideia de comunidade nos condomínios.

Jurado, além de arquiteto autodidata, construtor e incorporador, era um mestre em marketing imobiliário. Soube criar produtos certos em momentos precisos, além de incorporar o melhor da arte da época em diversos de seus projetos – o sucesso como empreiteiro, junto com sua formação na prática em arquitetura, fez com que ele sofresse perseguição do Crea e que fosse persona non grata entre nomes-chave da arquitetura paulista da época – resumindo: inveja.

Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Planalto


Outras menções honrosas do arquiteto são os Edifícios Planalto, Cinderela, Bretagne – todos valem a pesquisa no Google.

3. Edifício Louveira


Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Louveira


Esse é mais um na lista dos obrigatórios, principalmente devido a assinatura de João Batista Vilanova Artigas (ou só Artigas, para os íntimos) no projeto – talvez ele seja o mais queridinho da lista de arquitetos queridinhos em São Paulo.

Nos anos 1940, São Paulo ficou conhecida como “a cidade que mais crescia no mundo”, de tão rápida que foi a expansão da malha urbana – e é claro, era preciso espaço para acomodar tanta gente. Rapidamente, aquela cidade que lembrava uma metrópole francesa se transformou em uma cidade sem paisagem, sem ordem e sem controle, palco de grandes conflitos espaciais.

Os grandes arquitetos da época procuram respostas a esse problema – e aqui está a importância do Ed. Louveira. O bairro de Higienópolis sempre foi um reduto de tradicionais palacetes, que com o crescimento da população, foram aos poucos dando lugares a prédios residenciais. Mas se engana quem pensar que isso foi motivo de desvalorização da região, muito pelo contrário: era necessário convencer as elites que moravam no bairro a deixarem as suas espaçosas casas e se mudarem para apartamentos. Artigas, por sua vez, conseguiu fazer isso com maestria.



O prédio faz um ótimo uso do seu terreno espaçoso e da Praça Vilaboin, logo em frente – a ideia era fazer com que os moradores se sentirem como se estivesse em um jardim, lembrando os palacetes do bairro. Ao mesmo tempo, o projeto está perfeitamente na lógica da urbanização da cidade, isso é: trouxe alguns elementos que se tornaram regra na construção civil, sendo reproduzidos até hoje por toda a cidade. Isso pode ser observado na divisão geométrica das unidades, as linhas retas, os blocos paralelos.

É claro que Vilanova Artigas se destacou no meio de tantos outros arquitetos por bons motivos. Com formação de engenheiro e de artista, foi uma figura fundamental na aproximação arquitetura e das artes plásticas. Hoje, é o maior nome da chamada escola paulista de arquitetura e formou gerações de outros arquitetos. Inclusive, ele até projetou o prédio em que são formados os arquitetos na Universidade de São Paulo – e o prédio da FAU hoje é dos cartões postais da cidade.

Ah, o Estádio do Morumbi também foi ele!


Prédios mais bonitos de São Paulo: Fachada do Ed Louveira


4. Ed. Abaúna

O Ed. Abaúna foi projetado em 1960 pelo arquiteto Eduardo Kneese de Mello. Para quem não é do ramo da arquitetura, esse provavelmente é um nome desconhecido – porém, suas contribuições para a construção civil brasileira são bem mais famosas: Kneese, junto à alguns colegas, foram os precursores do uso de concreto pré-fabricado no Brasil – hoje, é um recurso quase que obrigatório em todo projeto.

Kneese ainda trabalhou com Oscar Niemeyer no projeto do Parque do Ibirapuera e em Brasília. Liderou a criação do departamento paulista do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), foi presidente do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea), esteve presente na criação do Sindicato dos Arquitetos do Estado de São Paulo, em 1971. Foi professor de Arquitetura por mais de 50 anos, lecionou no Mackenzie, na USP e na Belas Artes até sua morte em 1994.


Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Abaunas


O Abaúna foi a único projeto de luxo da carreira do arquiteto, que normalmente se dedicava a grandes residenciais pra a classe média, diversos espalhados pela cidade. Porém, o ponto fora curva da trajetória de Kneese também é um ponto fora da curva na paisagem urbana da R. Antônio Carlos, onde está cercado por construções mais recentes (e bem mais genéricas).

No prédio, temos um apartamento por andar - 500 m2!  Para dar privacidade aos dormitórios, a fachada é revestida com madeira Cabreúva, enquanto a sala de estar tem janelões do chão ao teto. Para um arquiteto conhecido pelo uso de concreto pré-fabricado, as placas de madeira na fachada são sinal de bom-gosto raro de se encontrar nas construções mais recentes.

5. O Copan


fachada do copan

Não tem como fazer qualquer lista de arquitetura de São Paulo sem falar do Copan – o prédio é um ícone da cidade. Apesar do Niemeyer levar a maior parte da fama, o engenheiro Joaquim Cardozo também merece reconhecimento por ter feito o projeto parar de pé.


Ed Copan visto de baixo para cima

A princípio, o Copan era pra ser um grande centro comercial no centro de São Paulo, que em 1966 ainda vivia todo o glamour da São João com a Ipiranga. Porém, a demanda do mercado imobiliário era enorme na época, o que fez com que o projeto fosse alterado para uso residencial. Mais ou menos 1200 residências, em que moram 5 mil pessoas. É o maior complexo residencial da América Latina e está localizado no coração da cidade – tem até um CEP próprio.


vista aérea do copan


6. Edifico Oito, em Pinheiros.


O Ed. Oito está nesta lista principalmente para mostrar que ainda se constroem prédios com muito bom gosto nessa cidade.

Prédios mais bonitos de São Paulo: Ed Oito


De muitas formas, o Ed. Oito é uma síntese de importante que foi pontuado nessa lista: o aproveitamento do terreno, o uso de áreas verdes, iluminação generosa, as formas geométricas e as cores. Contraído em uma encosta, é um projeto confortável, funcional e bonito, com uma vista privilegiada das margens do Rio Pinheiros.

O arquiteto, Isay Weinfield, talvez seja mais conhecido por ter projetado as charmosas unidades da Livraria da Vila – mas seu nome está entre os mais famosos do momento. Seu estilo minimalista e a tendência ao abstracionismo da forma é uma coincidência com o atual estado da arte contemporânea – certamente marcarão terreno na arquitetura “dos anos 2000”.


imagem aérea da avenida paulista

Enxergar além de todo esse cinza de São Paulo com certeza é uma tarefa difícil (para nós e para os arquitetos), mas não é impossível. Uma cidade tão grande possui diversos encantos nos lugares mais inesperados, e isso inclui sua arquitetura. Aqui nós separamos só seis construções que são ícones da arquitetura paulistana – mas é claro que existem muitos outros. Esses são só alguns dos nossos favoritos – quais são os seus?