Sou estudante de arquitetura e urbanismo da USP e me juntei a Citas no final de 2021. Resolvi compartilhar com vocês um pouco do que aprendi, pois acredito que a arquitetura, sendo economicamente viável e inclusiva, pode ser uma ferramenta importante  para realizar Impacto Social na habitação.


O FICA é um fundo a qual capta recursos através de doações, realiza a compra de imóveis em regiões centrais servidas de infraestrutura e aluga para famílias com renda de 2 a 3 salários mínimos. Meu primeiro contato com o fundo foi em 2021, quando soube que estavam promovendo uma oficina voltada para moradia de impacto social .



A oficina chamava Projetar no Pequeno e tinha como objetivo convidar alunos da graduação a elaborar propostas de ocupação e de mobília para um dos imóveis adquiridos pelo FICA.



As oportunidades e lacunas preenchidas pelo FICA


O imóvel escolhido fica localizado no bairro Bom Retiro, região central da capital paulista e tradicionalmente uma região ocupada por imigrantes com grande quantidade de serviços de costura, venda de roupas, produtos têxteis e máquinas de costura.


A família contemplada pelo imóvel é de origem boliviana e assim como muitos estrangeiros eles enfrentavam dificuldades de alugar um imóvel. Tais dificuldades ocorrem devido à baixa confiança que os locatários têm nos estrangeiros no pagamento de aluguéis, assim muitas vezes são exigido dos imigrantes uma série de documentos e valores adicionais para que eles consigam alugar um imóvel.



Um pouco da minha vivência internacional 


O que mais me atraiu para essa oficina foi justamente o fato dele contemplar pessoas estrangeiras, pois por diversas vezes tentei viver uma experiência no exterior, e por isso eu compreendia os diversos impasses que um imigrante tem em um país estrangeiro. 


No ano de 2020 estive em um processo para realizar um intercâmbio para a Inglaterra, mas por conta da pandemia não pude realizar a viagem. Apesar disso, mesmo dentro do Brasil eu procuro viver a experiência de um intercâmbio. Assim, através de um grupo de Arquitetura do Facebook conheci um arquiteto nigeriano que assim como eu estava se preparando para realizar um intercâmbio, só que para o Brasil. Confesso que todo o interesse e esforço que ele estava fazendo para vir para o Brasil me comoveu muito, pois eu estava concentrando todo o meu interesse e esforço em sair dele.


Acredito que uma forma de compreender melhor diferentes propostas de arquitetura é necessário conhecer outras produções já realizadas. 


A Oficina Tiny House


A partir dessa vivência visualizei o quanto um país como o Brasil é esperança de uma vida melhor para muitas pessoas de outros países, e essa era a busca que a família boliviana tinha ao permanecer em São Paulo, e todo esse insight foi o que me fez realizar a oficina.


E, para a realização dela, tivemos a incrível colaboração do arquiteto alemão Van Bo Le-Mentzel que através do estilo Tiny Houses pôde trazer um grande repertório de ocupação de pequenos espaços residenciais.

Aliás, esse vídeo dele sobre tiny houses é fantastico! vale a pena parar 15 minutinhos para assistir!


Uma marcante contribuição durante a oficina foram as sugestões de aproveitamento que ele fez sobre o corredor da casa. Este corredor ocupava uma porção relevante da área do imóvel, então ele sugeriu que esse corredor fosse diluído com móveis  e formas de ocupação


Os esboços dos trabalhos eram feitos dentro da plataforma Miro, abaixo um print da região da casa onde a partir da orientação do arquiteto a região a presença do corredor era mais forte e a segunda versão em que a mesa contribui para um melhor aproveitamento do ambiente.


       


O primeiro encontro da oficina ocorreu na Casa do Povo, local sede de diversas atividades de cunho social e cooperativos acontecem.



O perfil de pessoas beneficiadas pelo FICA


Depois, conhecemos o espaço de trabalho das integrantes do grupo de imigrantes. Conversamos com elas sobre o processo que levou elas à imigração da Bolívia para o Brasil, a chegada no bairro do Bom Retiro, o trabalho com a costura, a vida familiar, o desejo de ter um lar e a experiência delas com o FICA.


Elas eram de origem boliviana e não quiseram dar muitos detalhes sobre o seu local de origem, pois diziam ter sofrido muito lá. O Brasil se tornava para elas uma uma oportunidade para vida melhor, e assim o Bairro do Bom Retiro era um local bastante forte para a memória afetiva delas.


Por outro lado, imigrantes enfrentam uma série de dificuldades para a locação de imóveis e o fato delas trabalharem em casa com costura o processo se tornava ainda mais difícil, sendo os possíveis sons das máquinas e de pessoas trabalhando os motivos para a negativa.



Necessidades e produtos gerados na oficina


Fomos visitar o imóvel comprado pelo Fundo Fica. Ao chegar no local vimos que o imóvel fica em um pavimento superior de um sobrado, com cinco cômodos, um corredor principal e dois banheiros contando 83m² de área. A casa seria ocupada por uma família de 7 pessoas: um casal adulto com dois filhos crianças, um casal de idosos e um homem solteiro dipondo 11,8m² por pessoa.


Foi nessa oficina que conheci a Citas. A palestra realizada pela empresa mostrou para mim que uma empresa de capital privado pode, sim, possuir atividades que gerem impacto social como fruto do seu trabalho e ainda assim gerar lucro. Isso me fez acreditar novamente nas minhas buscas em torno do empreendedorismo e do impacto social que pode ser gerado a partir dele.


Segue os resultados obtidos durante a oficina: o projeto elaborado por mim e pelo meu parceiro, Pedro Lins, e as ilutrações também feitas por ele.


Imagem 1: Corte geral e planta do primeiro pavimento.


Imagem 2: Planta do teraço e do telhado propostos.






















Desdobramentos do Impacto Social na Habitação


Apesar das boas idéias levantadas, infelizmente poucas puderam ser de fato executadas.  A família necessitava se mudar o mais rápido possível para o local; e tanto o FICA quanto a família possuíam recursos limitados para a adaptação do imóvel, não sendo possível a realização de nenhuma reforma mais estrutural de ocupação das áreas naquele momento. 


Acredito que o contato com a produção habitacional de impacto social feita por diferentes tipos de organização foi o que mais me impactou. Compreendi que a partir de um objetivo em comum, de oferecer mais moradias de qualidade, é possível agir de inúmeras maneiras.